O símbolo de uma nação

por Jackie Mota 26.set.2013

 

uruguai 250Memória de viagem: as estradas vazias uruguaias (e o céu azul, azul)

Constantemente me coloco contra generalizações. Afirmações do tipo “os brasileiros são festeiros” ou “os norte-americanos são consumistas” não me agradam por me parecerem fadadas ao erro, enquanto algumas me agridem pessoalmente. Por isso, evito trabalhar com o personagem representativo, tomar uma pessoa famosa ou que conheci durante uma viagem como símbolo de todo um povo. Já no campo político trabalhamos sempre com uma figura humana que representa seu povo, por direito ou usurpação. Chefes de Estado agem no cenário internacional com autoridade para falar em nome de uma nação e também como o símbolo de todo um povo. Muitas vezes este ser humano, um presidente, príncipe, uma rainha, não condiz com a imagem que fazemos daquele país, uma imagem que podemos ter formado através da mídia ou por experiência própria, em uma viagem, por exemplo. Mas algumas vezes, raras, acredito, esta figura política emerge no cenário internacional como uma personificação perfeita da imagem que fazemos de seu país. É o que acontece comigo agora quando vejo o presidente José Mujica, do Uruguai.

Ainda postei pouco sobre nossa viagem ao Uruguai por aqui (sobre Colônia aqui e Montevidéu aqui), mas se não caí de amores por todas as cidades que visitei, voltei do país completamente encantada por seu povo. Veja bem, às vezes amo um lugar, atração, mas o povo me parece neutro, apenas simpático ou até desagradável. Me apaixonar pelo povo em geral me aconteceu pouco. Voltei assim da Bolívia, uma torcedora de coração pelo bem dos bolivianos. E do Uruguai voltei uma admiradora.

Em minha viagem achei o Uruguai um país velho, vazio e tranquilo. E sim, é verdade. A população uruguaia é de apenas  3,3 milhões de pessoas (todos os dados referidos aqui foram retirados do World Factbook). No Uruguai 13.9% da população tem mais de 65 anos (no Brasil temos 7,5%);  a idade média é de 34.1 anos (a nossa 30,3 anos); a expectativa de vida é de 76 ,6 anos (a brasileira é de 73). O crescimento populacional no Uruguai é de 0.25% por ano (nós crescemos a 0,83%). Mas o país parece vazio não pela pequena população, afinal o território também é muito menor), mas por outra característica, que muito nos falta: planejamento. As largas estradas uruguaias nos dão a impressão de que faltam carros (e pessoas) no país, quando na verdade mostra o quanto estamos acostumados ao imediatismo brasileiro que constrói vias que em sua inauguração já estão funcionando em sua capacidade máxima.

uruguai 1Memórias do Uruguai: Colônia

Sim, eles são tranquilos (e eu escrevo pensando na pronúncia em espanhol, tranquilo). Não se preocupam em construir algo que será usado plenamente apenas no futuro. Preocupam-se com o que é preocupação, o importante. Talvez por isso tenham uma taxa de alfabetização de 98%, enquanto nós estacionamos nos 90%. E não nos esqueçamos que nós gastamos uma proporção maior do nosso PIB em educação e que temos este, o PIB, um orgulho nacional de US$2.394 trilhões – o deles é de US$54.67 bilhões. Resumindo: não basta ter dinheiro, tem que saber usar e usá-lo para o que importar. O IDH deles é 0,792 e os nossos dados são 0,73 (dados do PNUD). Mais importante, no índice de Gini, que mede a desigualdade na distribuição de renda, eles figuram em 40º na lista, enquanto nós estamos em 17º.

Me pareceu, ainda, que os uruguaios são mesmo tranquilos, “na deles”. Se ligam no que é importante e não no que pensam deles. Talvez por isso estejam conseguindo avançar, ali na “esquina do Atlântico e do Prata”, em temas políticos que ainda são tabu e tratados com extremo maniqueísmos em outros países como no Brasil. E não de hoje, claro, já que em 1907 foram os primeiros na América Latina a aprovarem o divórcio. Aborto, legalização da maconha e casamento de pessoas do mesmo sexo por lá não são tabus, mas temas discutidos pela sociedade, uma sociedade que se importa consigo mesma e com o que importa.

Tendo esta imagem dos uruguaios guardada após nossa viagem, não posso me furtar a encarar Pepe, apelido de Mujica, como o protótipo do “meu” uruguaio. Um político que pouco se importa que seu discurso não vá seguir o protocolo cortês de um encontro internacional ou trazer uma proposição normativa inovadora, que diz o que quer dizer, o que pensa e, mais importante, o que faz. Pepe, que vive tranquilo, doando 90% de seu salário, morando na mesma chácara de antes de virar presidente, usando seu fusca 1987, tratando de temas que importam.

Tive vontade de escrever sobre os uruguaios hoje porque ontem Pepe discursou na Assembléia Geral da ONU, um discurso lindo, pacifista, a favor da democratização das decisões em órgãos multilaterais e uma aliança entre a política e a ciência para o progresso igualitário da humanidade, que reflete a prática verdadeiramente de Mujica. E que fala muito sobre os uruguaios, nas palavras e pela postura de Mujica. Confira a íntegra do discurso aqui, na tradução de Fernanda Grabauska para o Zero Hora. Abaixo selecionei alguns trechos. E sim, recomendo muitíssimo o Uruguai como destino de viagem. Está aí um país que vale a pena ser visto, em todos os campos.

IMG_4498Memórias do Uruguai: Punta del Este

Trechos do discurso de Mujica:

“Quem tivera a força de quando éramos capazes de abrigar tanta utopia! No entanto, não olho para trás, porque o hoje real nasceu das cinzas férteis do ontem. Pelo contrário, não vivo para cobrar contas ou para reverberar memórias.
Me angustia, e como, o amanhã que não verei, e pelo qual me comprometo. Sim, é possível um mundo com uma humanidade melhor, mas talvez, hoje, a primeira tarefa seja cuidar da vida”.

O combate à economia suja, ao narcotráfico, ao roubo, à fraude e à corrupção, pragas contemporâneas, procriadas por esse antivalor, esse que sustenta que somos felizes se enriquecemos, seja como seja. Sacrificamos os velhos deuses imateriais. Ocupamos o templo com o deus mercado, que nos organiza a economia, a política, os hábitos, a vida e até nos financia em parcelas e cartões a aparência de felicidade “.

Civilização contra tempo livre que não é pago, que não se pode comprar, e que nos permite contemplar e esquadrinhar o cenário da natureza.
Arrasamos a selva, as selvas verdadeiras, e implantamos selvas anônimas de cimento. Enfrentamos o sedentarismo com esteiras, a insônia com comprimidos, a solidão com eletrônicos, porque somos felizes longe da convivência humana”.

Não foram as repúblicas criadas para vegetar, mas ao contrário, para serem um grito na história, para fazer funcionais as vidas dos próprios povos e, por tanto, as repúblicas que devem às maiorias e devem lutar pela promoção das maiorias.
Seja o que for, por reminiscências feudais que estão em nossa cultura, por classismo dominador, talvez pela cultura consumista que rodeia a todos, as repúblicas frequentemente em suas direções adotam um viver diário que exclui, que se distância do homem da rua.
Esse homem da rua deveria ser a causa central da luta política na vida das repúblicas. Os governos republicanos deveriam se parecer cada vez mais com seus respectivos povos na forma de viver e na forma de se comprometer com a vida”.

A ONU, nossa ONU, enlanguece, se burocratiza por falta de poder e de autonomia, de reconhecimento e, sobretudo, de democracia para o mundo mais fraco que constitui a maioria esmagadora do planeta. Mostro um pequeno exemplo, pequenino. Nosso pequeno país tem, em termos absolutos, a maior quantidade de soldados em missões de paz em todos os países da América Latina. E ali estamos, onde nos pedem que estejamos. Mas somos pequenos, fracos. Onde se repartem os recursos e se tomam as decisões, não entramos nem para servir o café. No mais profundo de nosso coração, existe um enorme anseio de ajudar para que o homem saia da pré-história. Eu defino que o homem, enquanto viver em clima de guerra, está na pré-história, apesar dos muitos artefatos que possa construir”

Este é nosso dilema. Não nos entretenhamos apenas remendando consequências. Pensemos na causa profundas, na civilização do esbanjamento, na civilização do usa-tira que rouba tempo mal gasto de vida humana, esbanjando questões inúteis. Pensem que a vida humana é um milagre. Que estamos vivos por um milagre e nada vale mais que a vida. E que nosso dever biológico, acima de todas as coisas, é respeitar a vida e impulsioná-la, cuidá-la, procriá-la e entender que a espécie é nosso “nós””.

Texto e edição: Jackie; Fotos: Viaje Sim!

 

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Publicado por Jackie Mota

Uso minha formação em jornalismo e minha experiência organizando as viagens da minha própria família para escrever posts didáticos e detalhados para poupar o SEU tempo. Nos meus textos você encontra informações práticas apuradas com responsabilidade e organizadas de acordo com as necessidades do viajante. Referências histórias e análises sobre a política e impactos do turismo também estão presentes no meu trabalho para que você viaje bem informado, seguro e consciente - sou especialista em Relações Internacionais e Mestre em Estudos Estratégicos da Segurança Internacional.

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Comentários

  1. 26 set 2013

    Eu sou apaixonada pelo Uruguai. Também não gosto de generalizar, principalmente se for para apontar defeitos, mas os uruguaios sempre me pareceram educados e cultos. Estive duas vezes no país (o único a que já retornei) e em ambas só tive boas impressões. Eu e o Eduardo já pensamos em morar lá algum dia. Quem sabe no futuro? 🙂

    • 26 set 2013

      Eu acho uma idéia ótima. Também os achei cultos e educados, mas nada arrogantes, ao contrário, muito na deles.
      Espero voltar também ao país.
      bjs,

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